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Ah, o Vale do Pati.

Sempre que via as fotos e relatos das pessoas que já tinham feito a travessia desse vale, meu coração pulava de vontade, mas a cabeça dizia: você não vai aguentar. Entre a razão e a emoção decidi optar pela emoção e me joguei nessa aventura.

Lógico que antes me preparei fisicamente, li muito sobre o trajeto, opções de dormidas e escolhi fazer a minha estreia com uma amiga que já tinha experiência com o Pati. Depois de muitas conversas, escolha do guia, mais uma amiga estreante para compor o grupo e roteiro traçado, chegou o grande dia.

Aos poucos a ansiedade em subir a serra foi se misturando com um friozinho na barriga. Optamos em fazer a travessia completa, entrando por Andaraí e saindo pelo Vale do Capão. Para quem não sabe, existem algumas “formas” de fazer essa travessia. O Vale do Pati é bem extenso e tem algumas entradas e /ou saídas principais, por isso é recomendado fazer um roteiro antes de se aventurar.

Você pode optar por entrar ou sair do Pati pelas cidades de Andaraí (Império ou por Igatu), Guiné (Beco ou Aleixos), Capão, Mucugê. A depender da sua escolha, você vai andar mais ou andar menos. No meu caso, optei em cruzar o Vale de uma ponta a outra, por isso decidimos entrar por Andaraí e sair pelo Vale do Capão – a travessia completa.

Confesso que foi bem difícil esse trajeto, pois a entrada por Andaraí te presenteia logo de cara com quase 10 km só de subida. Mas em compensação ao descer a “Ladeira do Império”, você tem a opção de ficar numa das casas mais acolhedoras do Vale – Casa de Seu Joia e Dona Leu.

O Pati é dividido em três partes: Pati de Baixo, do Meio e de Cima. Por isso que optamos em cruzá-lo, para poder fazer o caminho da travessia completo e ter noção da extensão do lugar. Outra coisa que se deve atentar é que dentro do Vale, dependendo dos atrativos naturais que a gente escolha fazer, é importante definir o trajeto de forma otimizada para você poder aproveitar os locais que vai querer conhecer. São trilhas dentro da trilha, por isso que o número de dias que se passa no Pati influencia na quantidade de locais que você conhece estando lá dentro. Eu fiquei quatro noites e não foram suficientes para fazer tudo o que eu tinha planejado. A depender do seu cansaço, vale a pena tirar um dia no roteiro para ficar deitada na rede de uma das casas, apenas contemplando o visual.

A escolha do guia também é algo MUITO importante, bem como a escolha do grupo. Imagine você fazendo uma trilha puxada, num lugar lindo com um guia estressado e pessoas chatas ao seu lado? E rola muito isso, viu? Guias “estrelas”, guias descomprometidos, guias acelerados, guias loucos para terminar o trampo e se livrar de você, e claro, guias maravilhosos como foi o nosso. Jessé de apenas 19 anos foi o nosso condutor durante os cinco dias e quatro noites no Vale. Jessé é filho de garimpeiro, nativo de Andaraí e apesar de jovem na idade, tem uma enorme bagagem como trilheiro. Ele cresceu subindo e descendo o Pati e como estávamos fugindo dos “guias estrelas” e dos roteiros engessados que andam “empurrando” pra os turistas fomos de roteiro e guia ALTERNA e RAÍZ. A escolha não poderia ter sido melhor! Além disso, é importante lembrar que a atividade de guias locais deve ser incentivada, e contratar alguém da região contribui muito para a economia do lugar e incentivo à profissão.

Primeiro dia:

E lá fomos nos três (eu, @cissamarback e @elianecarlos) e Jessé. Começamos a subir a serra por volta das 8 horas e logo de cara encontramos uma jararaca pelo caminho. Se não fosse o olho treinado do guia, passaríamos batidas por ela, ou não…

Aos poucos a ansiedade foi ficando serra abaixo e com a respiração ofegante comecei a perceber que a subida parecia ser longa. Umas duas horas de subida, paramos no primeiro pico para apreciar a vista da cidade de Andaraí. A cidade lá longe parecia nos dizer “boa sorte e sejam guerreiras, porque tá só começando”. E depois de continuar caminhando muito, paramos para “almoçar”. Entre uma mordida e outra no sanduíche, uma respirada funda e a inevitável pergunta ao guia: tá perto de acabar a subida?

Kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkk e ele sereno dizia: ah, essa subidinha? Falta pouco.

MENTIRAAAA ahahaha no Garmin a subidinha marcou 9,6 km. Sem falar nos 10 quilos da mochila que carregava nas costas e o calor que fazia. Mas é aquela história, a montanha é dura, mas é recompensadora. E lá no alto tivemos a mais linda visão do que nos esperava lá embaixo. Do mirante, um paredão gigante se mistura com o verde da floresta e lá longe já avistávamos a nossa primeira parada, a casa de Seu Joia. Subida concluída é hora da descida. A Ladeira do Império não é moleza não, temos que ter todo cuidado do mundo pois o piso escorregadio e o local com pouca iluminação por conta das muitas árvores, é um convite para uma queda. E depois de descermos muito, finalmente avistamos a plaquinha tão sonhada: Casa de SEU JOIA.

Mas alegria de trilheira estreante no Pati, dura pouco. Da placa até a casa de Seu Joia, havia muito o que caminhar ainda, sem contar que no meio do caminho escorregadio, teria uma ponte e um rio com um volume imenso de águas agitadas. Eu tenho medo de pontes, acreditem. E não era uma ponte qualquer, era uma ponte amarrada com cabos de aço, pedaços de madeira e com um balanço bem divertido.

Juro que ali, naquele momento, eu pensei: dá pra voltar? Mas respirei fundo, chamei por Deus e lá fui eu bem devagarzinho. O detalhe mais legal dessa hora, foi que ninguém sabia que eu tinha medo de ponte, e quando as minhas duas companheiras viram eu andando que nem tartaruga pela ponte, foi que a ficha caiu e elas não sabiam se riam ou tentavam me ajudar com palavras de apoio moral.

Passei a ponte, obaaa! O pior acabou. Quem disse? O tempo começou a fechar e os relâmpagos e trovões pareciam festejar a nossa quase chegada. Hora de acelerar pela ladeira escorregadia e chegar na casa de Seu Joia.

E com o céu ficando cinza, raios e trovões, finalmente chegamos e fomos recebidas por Dona Leu e Seu Joia. O carinho, presteza e delicadeza dos dois foi o melhor welcome drink da vida. Ainda suadas e fedorentas, brindamos com uma cerveja gelada a tão sonhada chegada.

O banho gelado para recompor o corpitcho, a caminha limpinha e quentinha do quarto coletivo, o jantar delicioso de Dona Leu e a prosa com os demais hóspedes junto com a chuva forte que caia, fecharam o nosso dia com todas as chaves de ouro do mundo.

Para o segundo dia tínhamos planejado acordar, tomar café, passar no Poção da Árvore e pernoitar em Dona Raquel, mas algumas coisas deram errado e só conseguimos sair da casa de Seu Joia perto das 12 horas. Com a chuva forte, a terra virou um verdadeiro atoleiro, a cada passada o pé insistia em grudar, os rios transbordaram e tivemos que fazer muitos improvisos para atravessar de um lado para outro, não conseguimos passar o rádio (dentro do Vale a comunicação é feita assim de uma casa para outra) para avisar a Dona Raquel que íamos para lá. O céu abriu, mas o tempo não parou e anoitecemos na trilha. Será que deu tudo certo?

No próximo texto, conto mais essa aventura de quase termos ficado sem dormida e comida…

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