Em qualquer cidade que eu chego com o SMURF chamo muito à atenção, principalmente das crianças. Acho lindo quando escuto a criançada gritando: “olha, uma mulher no rally, uma mulher!”
Nessa expedição, a cidade que tivemos mais contato com os moradores, foi São Miguel do Araguaia. Como chegamos mais cedo, pudemos participar dos festejos em homenagem aos Sertões e conheci muitas mulheres que fizeram questão de ir ao nosso acampamento falar comigo. Quando elas ficaram sabendo que tinha uma mulher na equipe pilotando, deram o maior apoio moral e claro que eu amei.
Tudo isso me deixa muito orgulhosa, principalmente nessa Expedição. Esse Sertões foi bem diferente do ano passado. Em 2018 eu vinha de uma preparação física bastante intensa por conta da travessia do Pati – Chapada Diamantina, por isso eu passei o ano seguindo um treinamento forte de musculação e aeróbico, estava bem condicionada.
Já nesse ano, passei por um tratamento médico e não pude fazer os exercícios físicos com a intensidade que eu vinha fazendo. Fiquei praticamente 3 meses parada e só depois disso, eu comecei a fazer alguns movimentos ainda com restrições. Eu senti muito a falta desse condicionamento físico. Senti dores na coluna, na lombar, nas pernas… dores que já haviam ocorrido em edições anteriores antes do meu condicionamento. A diferença foi gritante.
O Sertões 2019 exigiu muito, porque a gente acordava de madrugada e dormia muito tarde, saíamos antes dos competidores e chegávamos depois deles. As distâncias eram longas, nós tivemos que armar e desarmar acampamento. Não tínhamos condições de descansar entre uma cidade e outra. Muitas vezes dormíamos às 22h e acordávamos às 4h da manhã. E eram justamente as demonstrações de amor, todos os abraços, acenos e incentivos que fui recebendo, tanto nos lugares por onde ia passando, quanto virtualmente nas muitas mensagens pelo Instagram e grupos de WhatsApp que participo, que me motivaram a seguir nessa loucura boa.
Trabalho Social
O Sertões tem um projeto chamado S.A.S – Saúde e Alegria nos Sertões, a organização da prova visita previamente as cidades que receberão a competição, faz um levantamento para identificar as maiores carências da comunidade e durante a expedição os moradores recebem assistência.
Cidades remotas com população carente recebem atendimento médico de ponta, graças aos quase 1.000 voluntários e 4 carretas médicas. Com foco nas especialidades de oftalmo pediatria (óculos para todos que precisam), odontopediatria além de dermatologia e ginecologia, ambas com foco em oncologia (câncer de colo do útero). Esse projeto salva vidas, ajuda as sertanejas a prevenir o câncer de colo do útero e distribui óculos para as crianças que não enxergam direito.
Na Expedição Sertões a contribuição ou doação foi livre, os integrantes podiam levar cestas básicas, roupas, brinquedos, produtos de higiene… e irem entregando aos moradores conforme a necessidade de cada comunidade.
Um momento que me comoveu bastante foi a entrega de bolas de futebol numa comunidade às margens do Parque Nacional das Nascentes do rio Parnaíba, povoado bastante carente, isolado e pequeno, com apenas duas ruas. Alguns pilotos da equipe levaram uma quantidade grande de bolas murchas e a medida que eles foram enchendo, umas cem crianças foram se aglomerando em volta dos carros.
Enquanto deixávamos a cidadezinha tivemos o privilégio de conferir a alegria e o sorriso no olhar daquelas crianças ao erguerem as bolas no alto dos morros. Sem dúvidas, cada integrante da equipe ficou com um rosto de uma criança feliz registrado na memória. Isso não tem preço!
Sertanejinho e Maria Fernanda
No ano passado, paramos num posto de combustíveis da cidade de Madalena/Ce, quando um senhor numa bicicleta acompanhado de uma criança parou para conferir os carros da Expedição. O menininho queria muito ver o “jipão”, após realizarmos a sua vontade, tiramos uma foto dele na frente de uma picape.
Publicamos a foto e logo depois obtive vários comentários e um retorno muito especial, uma garota chamada Maria Fernanda me enviou um inbox emocionada dizendo que não sabíamos o bem que tínhamos feito à comunidade e que achava a equipe o máximo. E após essa mensagem ela continuou a me acompanhar nas redes sociais e viramos instafriends.
Agora em 2019, eu postando as fotos da viagem nos stories, Maria me enviou uma mensagem no direct pedindo para que quando a gente passasse pela sua cidade parasse para dar um “xau”, falou que era muito minha fã e que sempre me acompanha. Prontamente eu falei com Renato Perotti, líder da nossa equipe, que precisaria parar num posto para cumprimentar uma seguidora que acompanha e gosta muito da gente, ele disse “ok”. Inclusive, até ofereceu doações que os pilotos da equipe ainda tinham no carro.
Ao chegarmos no posto de combustíveis a garota me deu um forte abraço e chorou. E claro, eu fiquei com o coração transbordando de amor. Ela aproveitou e me apresentou a mãe dela, agente de saúde na comunidade. Coloquei à disposição as doações e Maria aceitou de imediato a ajuda para sua comunidade.
Lucas, o sertanejinho, veio acompanhado da mãe e do pai em cima de uma moto, ele conferiu os carros e aí repetimos a foto do ano passado, agora com a camisa da equipe. Ano que vem esperamos reproduzir a ação solidária desta vez maior e planejada, já que se trata de uma comunidade carente e, a foto do menininho na frente do 4×4, é claro!

Chegada
A chegada é sempre emocionante, a ansiedade de passar pelo pórtico é muito grande, é como se você tivesse participando de uma corrida e estivesse nos metros finais. Também foi um dia estranho, vem uma emoção na boca do estômago, eu relembrei tudo que passei, me senti uma competidora. Participo do Sertões há três anos e a sensação se repetiu na mesma intensidade.
Foi uma verdadeira confraternização, a gente se encontrou com todos os competidores, eu tirei foto com Jean Azevedo, de quem sou super fã desde quando eu era adolescente. Pra vocês terem ideia, eu tinha pôster dele no meu quarto rsrsrs.
Fomos recepcionados pela galera da Triton 4x4Club do Ceará, infelizmente não pudemos desfrutar muito da cidade de Aquiraz, participamos da comemoração depois descansamos no hotel.
Campeões
Para mim a emoção maior do fim da prova não é conhecer os campeões mas, torcer pela chegada dos amigos, cumprimentar e festejar o fim da prova. Quando participo, não me apego muito a quem chegou primeiro, vejo as equipes como um todo. Tenho amigos que competiram, eu torci mais para que eles chegassem antes do dia acabar, do que para ganhar.
Volta pra casa
Após acelerarmos por 11 estados (BA, MG, MS, MT, GO, TO, PI, CE, RN, AL e SE) é chegada a hora de sacudir a poeira e pegarmos a estrada de volta para Salvador. Smurf se comportou muito bem, fizemos quase 9.000 km sem o aparecimento de nenhum problema grave. As únicas manutenções que precisamos fazer foi a substituição do filtro de ar, que já era mais do que esperada e a troca do para-brisa dianteiro. Nós todos pegamos estradas que não deixaram quase nenhum carro intacto, todos fomos agraciados com pedras que fizeram os para-brisas trincarem.
Fim de aventura e esfriado o motor, agora é hora de me programar para viver novas emoções e aventuras no Rally dos Sertões 2020. Nos aguardem!
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